Achei interessante apesar de não falar diretamente de jornalismo. Acho que tem um pouco a ver com o que discutimos na última aula.
No ambiente virtual, em busca do conhecimento real
01/04/2008
Como o jovem constrói sua identidade na internet? Foi com o objetivo de responder a esta questão que a professora Mírian Paura, do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), deu início à pesquisa "Ciberidentidade: a formação das identidades dos jovens na sociedade em rede". A pesquisa ouvirá alunos da rede pública e de escolas particulares de todo o estado, do nível fundamental ao ensino superior.Coordenadora da linha de pesquisa "Juventude, valores e educação", a professora pretende descobrir como as relações são construídas, hoje, pela juventude na internet. "Pretendemos também propor reflexões sobre a atual educação. Como a escola deve se pronunciar frente a estas novas situações que a internet cria?", questiona Mírian Paura. A pesquisa já começou e os resultados devem ficar conhecidos antes do final do ano.Em entrevista à FOLHA DIRIGIDA, a professora explica melhor como será essa pesquisa e quais temas orientam a sua realização. Ela aproveita para analisar o papel do livro em um mundo virtual, se diz preocupada com o uso que se faz da internet para pesquisas escolares e, ainda, elogia a educação a distância.
No Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), a senhora coordena a pesquisa "Ciberidentidade: a formação das identidades dos jovens na sociedade em rede". Qual o objetivo dessa pesquisa?
Mírian Paura - A pesquisa tem por objetivo verificar como os jovens formam a sua identidade através de encontros sistemáticos pela internet. Pretende analisar a questão das identidades dos jovens diante das novas tecnologias de comunicação e informação. O alicerce principal dessa pesquisa é fazer o levantamento sócio-histórico das identidades, bem como das tendências dos paradigmas educacionais. Em outras palavras, pretendemos verificar como esses jovens, hoje, atuam nessa rede, advinda do avanço da tecnologia. Pretendemos descrever a identidade do jovem virtual e propor reflexões sobre a atual educação, com o intuito de quebrar paradigmas. Existe um jovem hoje que não sai da frente do computador. Ele é capaz de viver não só as relações com amigos na internet, como cria uma realidade virtual, como o "Second Life". Uma questão que se coloca, portanto, é qual o papel da educação perante isso. Como a escola deve se pronunciar? E a família? A escola utiliza esses conhecimentos? O que esse jovem traz para a sala de aula desses conhecimentos adquiridos? E as novas amizades feitas via blogs ou por MSN? Como isso interfere na vida do jovem? Essas questões pontuam a nossa preocupação em estudar a juventude e sua relação com os avanços tecnológicos.
A pesquisa também mostrará como a internet influencia a educação desses jovens?
Sim. A pesquisa procurará conhecer os caminhos para uma nova aprendizagem e também como trabalhar esta realidade, promovendo melhores resultados. Pretendo refletir sobre três questões principais. Primeira: onde estamos nessa revolução tecnológica e em que patamar? A revolução advinda da tecnologia já foi comparada por autores como a Revolução Industrial do século XVIII. Hoje, a pessoa se espanta quando alguém não tem e-mail ou não utiliza o computador. E o jovem utiliza muito essa tecnologia. Segunda questão: por que o jovem utiliza essa tecnologia e como é formada a identidade dele? Existe uma identidade do grupo ou uma identidade cultural? Posso falar sobre a identidade cultural do jovem brasileiro? Mas, às vezes, ele tem amigos em outros países. Como fica isso? Terceira questão: qual o papel da educação e o paradigma que tenho que usar frente a essas novas mudanças? Essas são as questões mais significativas da pesquisa.
Como essa pesquisa será feita?
Na prática, vamos dividir o estado do Rio de Janeiro em quatro grandes áreas: norte, sul, leste e oeste. A intenção é lidar com um grupo de aproximadamente 2 mil alunos, o que tentará ser uma amostra diferenciada da população. A pesquisa será feita com alunos das redes pública e particular. Na verdade, ela já está acontecendo, pois a pesquisa começa, do ponto de vista prático, a partir de entrevistas e observações com alunos. Durante a pesquisa, vamos nas escolas em três momentos diferentes. No primeiro, para observar os alunos, os equipamentos existentes na escola e a relação dos estudantes com essas tecnologias. Em um segundo momento, aplicaremos questionários. No terceiro, faremos entrevistas complementares com alguns professores. A escola é o foco principal da pesquisa, mas também temos vontade, em cada região, de conhecer alguma ONG ligada à questão da juventude. Até agora, apenas nos aprofundamos na questão da fundamentação teórica, levantando os autores que nos darão base para compreender a construção da identidade pelos jovens através das novas tecnologias.
O que a pesquisa define como "juventude"? Qual a faixa etária a ser pesquisada?
Cada vez mais, hoje, utiliza-se este conceito de "juventude", e não de "adolescência". A juventude é uma categoria social cuja abrangência é muito maior do que a adolescência, que se refere a um período de transição entre a idade infantil e a adulta, com características próprias e muito ligadas a todo o desenvolvimento psíquico-social. Na nossa juventude estudada, temos um limite dos 13 aos 21 anos, porque vamos pesquisar segmentos diferenciados de formação escolar: desde a educação fundamental até o ensino superior.
O que será feito com os resultados dessa pesquisa?
Com os resultados da pesquisa temos, basicamente, duas grandes intenções. A primeira é fazer um mapeamento dessa realidade, porque nós, como educadores, não podemos fugir mais dela. Não posso dizer que esse dado não existe. O aluno pode não ter computador em casa, mas tem acesso através das lan-houses. Nesse contexto, também quero colocar a questão de que o jovem constrói a sua identidade através de todos os mecanismos que tem disponíveis, seja na família, na escola ou em outros locais. Portanto, a escola tem um papel importante, mas não é a única. Muitas vezes, no momento em que o jovem fica conversando na internet por horas, ele está recebendo mais informações do que durante o tempo em que passa na escola. Esta é uma questão muito significativa. Então, face a essa realidade, eu pergunto: o que nós, da educação, estamos fazendo? Há poucos dias, o governador Sérgio Cabral anunciou que disponibilizará notebooks para os professores. O que essa ferramenta, em si, tem a ver com a educação? O professor vai se familiarizar com a Informática, o que é ótimo, mas como isso será revertido para a sala de aula? Quero, com a pesquisa, oferecer subsídios para uma reflexão da realidade e, assim, paulatinamente, mudar os paradigmas da educação.
Os alunos, hoje, já lidam com a tecnologia desde os primeiros meses de vida. E os professores? Eles estão mais familiarizados ou ainda há um grande atraso?
Não tenho dados precisos para dizer se eles estão atrás nesta questão. Mas acho, em termos de escola pública, que há sim um atraso. Isso porque em muitas escolas em que há computadores não existem máquinas em número suficiente. Não é o caso de haver um computador para cada aluno, mas um laboratório que pudesse atender às necessidades. Precisamos muito - e o governo do Estado me parece que está preocupado com isso - em agilizar este processo. Volto a dizer: não é só a questão do instrumento em si, é como utilizá-lo e quais são os ganhos que ele representa.
Atualmente, o jovem passa muito tempo na frente do computador. Isso atrapalha a socialização de alguma forma?
Costumo dizer que, se por um lado o jovem busca novas amizades, por outro lado, acaba ficando mais solitário. Isso é muito comum. Existem jovens que moram em um condomínio e se comunicam com os outros via internet, estando próximos uns dos outros. Ou seja, o computador me permite ter amigos muito distantes, mas fico inquieta quando vejo que a pessoa tem um amigo do seu lado e prefere usar a internet. Esse tipo de utilização - que poderia chamar de compulsiva, mas não vou - me preocupa. O que me pergunto é: esse jovem não tem condições de se relacionar com outro pessoalmente? Por que ele se basta com uma tela de computador? Será que é porque, ali no computador, o jovem urge em fazer mudanças, sendo mais audacioso e mais ousado? Aquela é uma representação de uma vida que não é real? Essas e outras questões, como educadora, me preocupam. Evidentemente, não dá para dizer que eles têm que ficar sem internet, até porque, hoje, qualquer coisa, até as que parecem impossíveis, consegue-se encontrar no caminho na internet.
Muito já se falou que as novas tecnologias substituiriam o livro. A senhora acredita que o livro perdeu espaço para estas mídias?
De forma alguma. O livro é o mesmo sempre. Ao ato de folhear ou sentir o "cheiro" do livro não há nada igual. Fazer uma leitura de página por página é uma coisa bem diferente do que fazer uma leitura virtual. Acredito, inclusive, que as novas tecnologias podem até alavancar uma leitura maior, o que é muito interessante. Mas não há nenhuma substituição. E mais: na era da internet, o incentivo à leitura deve ser dado nas duas dimensões, tanto virtual como presencial. É óbvio que na leitura virtual há uma série de fatores que atraem mais a atenção, como imagens, animações e interação. Porém, o livro continua a ter um peso importante.
A linguagem utilizada na internet recebe críticas de educadores e lingüistas. Escrever de maneira diferente na internet prejudica o desenvolvimento da escrita do aluno?
Não acredito que o "internetês" provoque isso. Este tipo de escrita, hoje, já é utilizado até por outras gerações. Pessoas não tão jovens inserem em e-mails, por exemplo, "ABÇ" como "abraços" e "BJ" como "beijos". O "internetês" é uma forma de se comunicar mais engraçada e menos formal. Aí, mais uma vez, cabe ao professor informar que aquela escrita se destina a um tipo de relação. No futuro, na formalidade de um trabalho, em uma situação mais convencional e protocolar ou em uma prova de vestibular, aquela linguagem será prejudicial a ele, porque esta não é a norma culta. No meu grupo de pesquisa na Uerj já fizemos um dicionário de "internetês" e ficamos impressionados como aparecem cada vez mais novas palavras. Em determinados momentos, você precisa ter praticamente um tradutor, porque algumas expressões, de imediato, não são fáceis de entender. É um idioma novo, mas não dá para dizer para o estudante que, a partir daquele momento, ele não pode mais usar aquelas expressões.
Hoje, a internet é um dos meios mais utilizados pelos estudantes para pesquisa. Porém, muitos educadores criticam esta ferramenta porque o aluno tende a apenas copiar a informação que encontra. Qual sua visão sobre esta questão?
Uma preocupação que tenho em relação à internet é o cuidado para que ela não seja uma faca de dois gumes. Uma coisa é você pesquisar na internet. Outra é você copiar como sendo seu os dados que estão na rede. Mais uma vez o professor tem que trabalhar com valores. Até porque, se o aluno apresenta um texto de um autor muito conhecido, o professor pode reconhecer o texto e pedir para o estudante rever o trabalho, pois aquele texto não é dele. Mas será que eu tenho o direito de achar que uma pessoa não tem condições de apresentar um bom trabalho? Eu não estaria pré-julgando, dizendo para um aluno: "esse trabalho não é seu, porque você não tem competência para fazer isso"? A internet traz um leque de opções a perder de vista e há, sim, uma questão de valores nisso. Uma vez, no elevador, ouvi dois alunos conversando e um deles falou: "nunca foi tão fácil fazer trabalhos como hoje. A gente vai na internet, pega uma parte, junta com outro trecho e monta o trabalho". E aí? Isso é bom? O que posso concluir é que, antes, era bem mais trabalhoso para o aluno: ele tinha que ler livros e ir a bibliotecas. Hoje, está tudo mais fácil.
A educação a distância é uma modalidade de ensino em crescimento no Brasil. A senhora acredita que ela vem sendo bem utilizada?
Sim. Acredito que os primeiros cursos que tivemos em educação a distância eram menos complexos que os de hoje. De lá para cá, tivemos avanços significativos. A meu ver, a educação a distância é uma modalidade de ensino extremamente satisfatória para um país gigante como o nosso. Uma coisa é a oportunidade que tenho, em uma cidade grande, de ter acesso a diferentes cursos, principalmente os de nível superior. Outra bem diferente é viver em regiões longínquas, onde as crianças têm, para irem para aula, que andar uma hora de barco, por exemplo. A educação a distância tem grande importância, sem dúvida. Infelizmente, ela já foi vista como algo que não era sério. Diziam que era uma forma de apenas conseguir um diploma. Hoje, acho que ela já é melhor vista, mas ainda não é aceita totalmente.